domingo, 29 de novembro de 2009

Lal, pequeno na estatura dos homens, mas grande para Deus

Kathmandu, 28, Novembro 2009

Queridos Amigos,

Conhecemos o Pr. Lal Bahadur Bialkoti no inicio de 2001. O nome BAHADUR significa “Valente”. Por ser considerado “casta-baixa” (a casta nepalesa aparece no sobrenome de cada pessoa, no caso dele BIALKOTI) sendo considerado assim, ele vivia o peso dessa questão social do contexto nepalês. Antigamente ele tinha a tristeza que seus companheiros da época não comiam em sua casa, porque tocar nas coisas e comidas dos considerados “castas-baixas” significaria se tornar impuro para os que consideram "castas-altas".

Infelizmente, não escondo esse fato, mas o exponho com dor, que no Nepal mesmo em alguns segmentos do meio cristão, muitas vezes o contexto das castas ainda prevalecem, pois fazem parte da Historia e da cultura nepalesa.

Lal Bahadur e’ e sempre foi um grande homem de Deus, mas escondido num corpo de pequeno porte, baixinho, magro, ele passa desapercebido aos olhos de muitos.

Logo no primeiro contato, no inicio de 2001, estávamos com visitas, as missionárias da JOCUM Márcia e Suzana, e com nosso obreiro da época, o Kandy que nos apresentou o Lal e fazia as traduções. Nessa primeira tarde, a Rose fez pipoca e passamos a vasilha ao Pr Lal Bahadur que tomou toda para si. Confesso que pensei: “que cara mal educado, pegou toda bacia de pipocas...” eu não tinha relacionado ao fato que todos os que eram considerados “casta-baixa” todas as vezes que nos oferecíamos alguma coisa, fosse numa bandeja ou num prato com biscoitos, eles tomavam todo o recipiente para si mesmos, pois na cabeça deles como “castas-baixas” que pensavam ser, nos (que como estrangeiros éramos considerados "castas-altas") não poderíamos participar com eles do mesmo recipiente.

Mas nessa falta de pratica com a questão de castas (que nunca consideramos, pois sempre procuramos tratar a todos com igualdade) não pensamos no que haveria de vir, pois no momento da pipoca, eu passei a servir da mesma vasilha, assim, ele ficou um pouco emocionado e disse que queria trabalhar conosco e ser como nosso filho. Eu surpreso perguntei o porque de tal decisão tão rápida, ele me disse: “porque eu tinha pedido um sinal a Deus que quem comesse comigo, me considerasse um igual, então seria meu pai, meu líder”.

Ele jantou conosco e no dia seguinte, já estava vestido com uma roupa que nos havíamos lhe dado no dia anterior.

Conto isso não para valorizar algo de nos mesmos, mas para perceberem o contexto e conhecerem um pouco nosso querido Lal Bahadur.

Nosso relacionamento foi crescendo, o Pr Jose veio em setembro de 2001 e fomos na montanha onde ele vivia com sua família e tinha uma pequena igreja. Eu tinha ouvido falar de tigres que rondavam naquela região e tal aventura não me animava muito... mas por insistência fomos e vimos um homem simples, numa casa simples, com vacas e cabras morando no andar de baixo e ele e a família no andar de cima da pequena casa que nos fins de semana era também a igreja. Vivia ele ali com sua esposa e seus quatro filhos (esposa Hira Maya, e filhos Kopila, Umesh, Philip, Shara).

Fomos recebidos com flores do campo pelos membros de sua pequena igreja. Nunca me esqueci desse momento, tudo muito simples, mas a presença de Deus era quase que palpável.

Ele nos ofereceu como almoço mamão verde com arroz e algumas ervas verdes colhidas na sua horta, eram as únicas coisas possíveis que ele tinha para oferecer (nem posso contar como foi cozinhado...) mas mesmo em sua condição de casta, mesmo na sua pobreza de bens materiais, simplicidade ou falta de conhecimento técnico de muitas coisas, ele parecia viver num nível acima de todos nos. Sabia ele (e nos) que com Deus ele não era casta-baixa e assim, sempre percebemos que ele participa de coisas de alto nível das escalas e castas celestiais.

Voltando ainda em 2001, o Pr Jose como MCM logo o adotou como o primeiro pastor a ser apoiado nas montanhas do Nepal, ele de uma igreja, ele saltou em alguns poucos anos para 4 igrejas implantadas e centenas de pessoas tocadas pela mensagem do Evangelho. Hoje seus liderados tem pelo menos 10 igrejas pelas montanhas do Nepal.

Nos tempos da guerrilha que assolou o Nepal, ele se relacionava bem com o exercito nepales ao mesmo tempo que se relacionava assustadoramente bem também com os guerrilheiros maoístas, isso não significava que ele “jogava nos dois lados” mas significava que ele “abençoava os dois lados” pois não poucas vezes ele orou por guerrilheiros feridos, as vezes, como medico improvisado, extraia balas dos corpos dos guerrilheiros comunistas (claro que os instrumentos não eram nem um pouco esterilizados, afinal o Lal dizia: “o que e’ isso? e para que isso de esterilização?” e ainda os medicava com algum remédio improvisado da montanha e não poucas vezes, também com um boticão improvisado (e de novo, nem de longe esterilizado) ele arrancava dentes de pessoas que o procuravam para tal serviço. Claro que o local era bem apropriado, geralmente seus pacientes sentavam-se entre as cabras e búfalos que ficavam ao redor de sua casa.

Sua versatilidade pastoral, "medica" e "odontológica" sempre foi inspiradora a nos pastores brasileiros.

Lal também sempre ora pelas pessoas com doenças diversas, espirituais, físicas, emocionais, se tornou uma referencia de fazer o bem e ajudar pessoas na sua montanha e nas montanhas ao seu redor, começou vôos mais altos e chegou a visitar a Índia e outras regiões mais distantes do Nepal. O que passou a receber de ajuda financeira, quase sempre era usada para socorrer outras pessoas, ele nunca ficava com nada.

Ele sempre nos trouxe pessoas valiosas, como Promila, a segunda menina a ser recebida em nosso meio em 2001, hoje pastora e que por sinal, ele também apresentou para a Promila aquele que seria depois seu marido (Stevens).

Mesmo amando ao Pastor Lal e admirando sua versatilidade “medica” e espiritual, confesso que tivemos vários momentos de crises e atritos, ele por vezes fazia coisas que desafiavam o bom senso e nos deixava como dizemos no evangeliques: “na carne”.

Algumas vezes ele age de forma engraçada, como no episodio do casamento da Promila, quando chegou quase 1h atrasado e entrou direto na cerimônia e ficou ao lado da noiva na frente do altar, estava ainda com parte do terno sujo e rasgado em algum lugar, isso foi justificado pelo fato que ele tendo vindo ao casamento de carona numa motocicleta, na pressa de chegar, haviam caído da moto e rasgado o terno, assim, com tantas situações cômicas e as vezes nem tanto cômicas, confesso que nem sempre nossa relação foi engraçada.

Nesses anos todos, sempre se manifestou nele sinais que Deus o usava em curas milagrosas, ele orou por mim em 2006 quando eu estava com sérios problemas renais, orou pela Rose em 2008, sei que muitos oraram por ela, mas vi Lal ligando seu celular (sim, celular, não perca a cronologia dos fatos, agora estamos falando de 2008 e ele tem um celular, mesmo sendo um simples pastor de uma montanha do Nepal ele se tornou mais moderno...ainda que seu celular e’ remendado com elástico, rsrsrsrsr) mas vi ele pelo fone pedindo oração em sua igreja, logo antes de por a mao e orar pela Rose com muita compaixão. Sei de muitos casos e muitas pessoas foram curadas por Deus pelas mãos de Lal.

Amigos, lhes conto tudo isso e lhes escrevo este e-mail com peso no coração:

Exatamente hoje o visitamos e falamos com seu medico em Dhulikhel região de Kavre-Palanchowk onde ele vive, Lal esta num hospital, gravemente enfermo, ele foi diagnosticado com câncer, já são 5 tumores em seu pequeno corpo, alguns em partes vitais como fígado e pâncreas. Os médicos já dizem que as noticias são muito ruins do ponto de vista da medicina, no desespero de ajudar, falamos aos médicos de levarmos ele para algum local com mais recursos para tratamento (pensávamos no Brasil ou Tailândia) mas os médicos disseram que não ha muitas chances, que o tratamento e' o mesmo em qualquer lugar do mundo e que na verdade, que não ha muito o que ser feito. Saímos de la atordoados (eu, a Promila, Stevens e o Pr. Vinicius).

Mas cremos em milagres e se foi algo que Lal sempre creu, foi em milagres, tantos que ele mesmo viu acontecer pelas suas frágeis mãos. Ele diz sorrindo e alegre como sempre que quer sair do hospital e quer abrir mais 50 igrejas. Sua alegria e’ impressionante, quantos estão insatisfeitos quando tem tanto, e quantos são felizes tendo tão pouco, Lal quer apenas um pouco mais do fôlego de vida para assim, em nome de Jesus, curar mais alguns.

Pedimos aos queridos que estão lendo este e que através deste conheceram um pouco esse pequeno grande homem de Deus que orem por ele com compaixão. Aos que já o conheciam, sabem que o que digo e’ verdade.

Abraços do Nepal, onde já estão soprando os ventos gelados do inverno nos Himalaias, mas mesmo já entrando neste inverno, estamos com muita esperança num milagre que venha aquecer a vida do Lal Bahadur.


Silvio


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